Uma bugra sulmatogrossense na Europa. Agora em terras baianas.
terça-feira, 6 de agosto de 2013
Falar é antes de tudo deter o poder de falar. Ou, ainda, o exercício do poder assegura o domínio da palavra: só os senhores podem falar. Quanto aos súditos, estão submetidos ao silêncio do respeito, da veneração ou do terror. Palavra e poder mantem relaci onamentos tais que o chefe de Estado, o homem de poder é sempre não somente o homem que fala, mas a única fonte de palavra legítima: palavra empobrecida, palavra certamente pobre, mas rica em eficiência, pois ela se chama ordem e não deseja senão a obediência do executante.
Pierre Clastres, A Sociedade contra o Estado.
domingo, 2 de junho de 2013
Meu banheiro azul não tem azulejos. Ele foi mal construído às pressas, sem nenhum capricho.
Nas paredes só tinta a óleo que por preguiça ou relaxo do pedreiro foi passada diretamente na parede de cimento. Sem massa corrida, sem isolante, sem nada.
Marcas de mofo branco se intercalam no fundo azul. Numa delas pode se ver um senhor de sobretudo e chapéu conversando com um coelho branco enorme.
Uma pia branca de plástico, um vaso sanitário e a caixa de descarga, duas prateleiras brancas e uma marrom e o chuveiro compõem todo o seu mobiliário.
Meu banheiro não tem forro, o teto é de telhas, de cimento e de teias de aranha. Durante o período de chuvas não é necessário nem ligar o chuveiro para tomar banho.
Duas portas fazem ângulo,, uma para o quarto e outra para a área de serviço ou pedaço de quintal entre a parede e a cerca, com um tanque, baldes e um varal.
Meu banheiro é feio, foi construído para ser reformado.
Não será por mim. A mudança que espero é bem maior.
sábado, 1 de junho de 2013
Naquela casa, que mais parecia de papel, uma série de eventos impossíveis se sucediam.
Aqui e ali brotavam, por feitiço ou magia seres da terra, da água e do ar.
Fadas azuis de asas transparentes, gnomos com cheiro de terra, duendes brincalhões, salamandras pingando a água gelada das cavernas. Gerações de pequenos animais saídos de um bestiário impossível se sucediam naquele espaço de etérea alegria. E todo dia era dia de festa, faunos assanhados e ninfas inquietas vinham comemorar a maravilha da palpabilidade da existência da vida, do respiro, do sol que queima, do orvalho que faz brilhar e do frio que aproxima corpos.
Tudo acontecia, espontaneamente acontecia. Porque só assim era permitido existir.
Este é o único espaço no blogger que gosto, então voltei a ele. Depois de Paris nos mudamos para Itacaré na Bahia, decisão precipitada e que ainda, depois de três anos eu não sei se foi a decisão certa. Ainda não era hora de voltar para o Brasil...
Mas como eu não posso me dar ao luxo de ficar triste esperando, o jeito foi viver da melhor forma que conseguir por aqui, me acostumando a um mundo que é completamente novo, mas tantos outros já foram e eu consegui me adaptar.
quarta-feira, 11 de novembro de 2009
De volta para o Brasil
Depois de uma viagem que pareceu uma via crucis, duas horas de avião até Roma, um dia inteiro passeando para esperar o vôo das dez da noite, mais 12 horas dentro de um avião, dois dias e meio em São Paulo, sempre acho bom começarmos em doses homeopaticas quando se trata de apresentar o Brasil para um extrangeiro, e depois para chegar em casa mais 18 horas de ônibus até Ponta Porã.
Uns dias depois e devidamente descansados nas águas de Bonito ja estamos prontos para encarar mais um ônibus até Campinas e um avião até Maceió.
Uns dias depois e devidamente descansados nas águas de Bonito ja estamos prontos para encarar mais um ônibus até Campinas e um avião até Maceió.
sábado, 24 de outubro de 2009
sábado, 17 de outubro de 2009
Argélia, Fotos
Estou publicando fotos da Argélia, a quem interessar possa, nesse endereço: www.photosamya.tumblr.com
Argélia - Mulheres
Françoise Fillion disse duas coisas em uma de suas inumeras entrevistas que me deixaram um pouco reticente, que a Argélia não tinha maturidade politica suficiente para se governar sozinha e por isso ela não era contra a independência mas sim contra a indepedência naquele momento historico. E a outra coisa, que num pais como a Argélia, o minimo direito que pudessem usufruir as mulheres teria que ser uma conquista dos homens, pois quando a metade da população não tem acesso a educação e ao conhecimento fica complicado que ela possa defender direitos que nem mesmo sabe que tem.
No primeiro caso, ainda tendo minha propria opinião, e eu tenho sempre uma opinião, eu não me sinto no direito de meter o bedelho porque ainda preciso aprender muito sobre todo o processo historico argelino antes da independência, mas no segundo caso estou completamente de acordo com essa senhora, a minima melhora na condição feminina na Argélia tera que vir dos homens e sera pela educação e pelo acesso aos meios de informação por parte das mulheres e isso serão eles a permitir.
O status quo atual so ajuda a classe politica dominante e ninguém mais, me pergunto e perguntei a varios homens na Argélia: E possivel a transformação social que os argelinos sonham depois de 62, quando a metade da população não são consideradas como cidadãs porque pertencem ao outro sexo? E como num pais dependente de uma potência extrangeira e escravista lutar pela liberação sem lutar contra a escravidão.
Porque de nada serve ser o sexo dominante e o macho que manda na tropa se essa tropa é constituida da parte mais fragil e mais ignorante da sociedade. Espero que um dia os homens se dêem conta disso, mas devo admitir que não tenho muita esperança.
No primeiro caso, ainda tendo minha propria opinião, e eu tenho sempre uma opinião, eu não me sinto no direito de meter o bedelho porque ainda preciso aprender muito sobre todo o processo historico argelino antes da independência, mas no segundo caso estou completamente de acordo com essa senhora, a minima melhora na condição feminina na Argélia tera que vir dos homens e sera pela educação e pelo acesso aos meios de informação por parte das mulheres e isso serão eles a permitir.
O status quo atual so ajuda a classe politica dominante e ninguém mais, me pergunto e perguntei a varios homens na Argélia: E possivel a transformação social que os argelinos sonham depois de 62, quando a metade da população não são consideradas como cidadãs porque pertencem ao outro sexo? E como num pais dependente de uma potência extrangeira e escravista lutar pela liberação sem lutar contra a escravidão.
Porque de nada serve ser o sexo dominante e o macho que manda na tropa se essa tropa é constituida da parte mais fragil e mais ignorante da sociedade. Espero que um dia os homens se dêem conta disso, mas devo admitir que não tenho muita esperança.
Argélia
Ja estou de volta. O bom de sair de uma cidade poluida como Paris é conseguir passar semanas sem alergias e sem acordar espirrando todos as manhãs.
No resumo gostei muito de ter ido para a Argélia. Na verdade sempre quis viajar pelos paises do mediterrâneo, e dos dois lados. Eu imaginava a Argélia um pouco parecida com o Marrocos mas me enganei, alias me enganei porque temos o mau costume de pensar a Africa como um troço mais ou menos homogeneo e é um pensamento absurdo e preconceituoso.
A paisagem que vi na Argélia é de tirar o folego, montes cobertos de oliveiras e arvores frutiferas, vales cobertos de floresta, montanhas e o mar. So tem um porém, o lixo onipresente. Na Cabilia eu demorei quatro dias para ver a primeira lata de lixo, a praia é uma descarga, o unico caminhão de lixo que vi por la pegava o lixo jogado na cidade, e digo jogado porque eles vão amontoando nas esquinas até o dia da passagem do caminhão, joga o lixo nos precipios, na beira das estradas, quer dizer o primeiro vento forte ou a primeira chuva e tudo vai para o mar. Nunca em toda a minha vida o lixo me incomodou tanto, mas eu nunca tinha visto tanto lixo. Conversei sobre isso com varias pessoas locais e a resposta foi sempre a mesma, o governo abandonou a região e o lixo na verdade não incomoda ninguém. Para todo mundo com quem falei, e falei com muita gente, não tem nada de anormal em jogar o proprio lixo na rua ja que todo mundo faz.
Mas acho que mais que uma politica governamental, devem estar tentando afogar a população num mar de dejetos, a questão é mesmo educação, porque em Argel onde passei uns dias a situação é a mesma. So que la vi latas de lixo. Vazias. E o lixo no chão.
E por falar em Argel nunca tinha visto tanto barbudo junto e tanta mulher completamente velada como nesta cidade. Se na Cabilia as mulheres usam e abusam do belo traje tipico colorido que não cobre a cabeça ainda que muitas usam um lenço por questões praticas ja que passam a maior parte do tempo na cozinha, em Argel grande parte da população, pelo menos as pessoas que encontrei na rua, usam o véu e os senhores deixam a barba.
Vim de la com um gosto de quem comeu so uma colher do doce de leite e queria o pote inteiro. Não visistei a Casbah como queria, so dei uma volta. Não conheci os palacios escondidos nas vielas sombrias e não tive a oportunidade de conversar com pessoas desconhecidas. Pouco tempo e eu não estava sozinha, e detesto viajar em companhia!
Em Argel senti uma sensação de mal-estar que nunca tinha sentido em cidade nenhuma, é como se sentir que não se é bem vindo num lugar, tive a impressão que as pessoas não sorriem nunca, e que os extrangeiros não são bem vindos.
Mas esta é claro, a minha impressão pessoal e como sou otimista sei que se ficasse la uns dias a mais e pudesse vagabundear um pouco pela cidade eu mudaria de opinião.
No resumo gostei muito de ter ido para a Argélia. Na verdade sempre quis viajar pelos paises do mediterrâneo, e dos dois lados. Eu imaginava a Argélia um pouco parecida com o Marrocos mas me enganei, alias me enganei porque temos o mau costume de pensar a Africa como um troço mais ou menos homogeneo e é um pensamento absurdo e preconceituoso.
A paisagem que vi na Argélia é de tirar o folego, montes cobertos de oliveiras e arvores frutiferas, vales cobertos de floresta, montanhas e o mar. So tem um porém, o lixo onipresente. Na Cabilia eu demorei quatro dias para ver a primeira lata de lixo, a praia é uma descarga, o unico caminhão de lixo que vi por la pegava o lixo jogado na cidade, e digo jogado porque eles vão amontoando nas esquinas até o dia da passagem do caminhão, joga o lixo nos precipios, na beira das estradas, quer dizer o primeiro vento forte ou a primeira chuva e tudo vai para o mar. Nunca em toda a minha vida o lixo me incomodou tanto, mas eu nunca tinha visto tanto lixo. Conversei sobre isso com varias pessoas locais e a resposta foi sempre a mesma, o governo abandonou a região e o lixo na verdade não incomoda ninguém. Para todo mundo com quem falei, e falei com muita gente, não tem nada de anormal em jogar o proprio lixo na rua ja que todo mundo faz.
Mas acho que mais que uma politica governamental, devem estar tentando afogar a população num mar de dejetos, a questão é mesmo educação, porque em Argel onde passei uns dias a situação é a mesma. So que la vi latas de lixo. Vazias. E o lixo no chão.
E por falar em Argel nunca tinha visto tanto barbudo junto e tanta mulher completamente velada como nesta cidade. Se na Cabilia as mulheres usam e abusam do belo traje tipico colorido que não cobre a cabeça ainda que muitas usam um lenço por questões praticas ja que passam a maior parte do tempo na cozinha, em Argel grande parte da população, pelo menos as pessoas que encontrei na rua, usam o véu e os senhores deixam a barba.
Vim de la com um gosto de quem comeu so uma colher do doce de leite e queria o pote inteiro. Não visistei a Casbah como queria, so dei uma volta. Não conheci os palacios escondidos nas vielas sombrias e não tive a oportunidade de conversar com pessoas desconhecidas. Pouco tempo e eu não estava sozinha, e detesto viajar em companhia!
Em Argel senti uma sensação de mal-estar que nunca tinha sentido em cidade nenhuma, é como se sentir que não se é bem vindo num lugar, tive a impressão que as pessoas não sorriem nunca, e que os extrangeiros não são bem vindos.
Mas esta é claro, a minha impressão pessoal e como sou otimista sei que se ficasse la uns dias a mais e pudesse vagabundear um pouco pela cidade eu mudaria de opinião.
terça-feira, 6 de outubro de 2009
Diario de viagem: Argelia 1
Querendo ou não terminamos sempre emitindo julgamentos de valor relativos a uma cultura diferente e fazendo comparações com a nossa, é humano e ainda que seja de um imenso etnocentrismo seria muito dificil fechar os olhos para tamanha falta de respeito ao direito das mulheres e das crianças.
Estou ainda na Argelia, mais precisamente numa região chamada cabilia, povoada quase totalmente por berberos que ja estavam aqui antes mesmo da chegada dos fenicios.
Tenho convivido com muitas mulheres, e ainda que vinte dias é pouco tempo demais para falar com segurança do que quer que seja, acho que ja consegui perceber algumas coisas.
Na lingua cabila, por exemplo, as formulas de saudaçao enderaçadas a mulher e ao homem sao completamente diferentes: Uma mulher so existe pela familia, pelo marido e pelos filhos, um homem existe por ele mesmo.Por isso quando se encontra uma mulher se diz, literalmente, que deus abençoe os teus, e ao contrario, quando se encontra com um homem, a saudaçao correta é, que deus te abençoe.
A partir dai se começa a compreender um pouquinho a relaçao entre homens e mulheres, mas isso sera para depois porque a gororoba por aqui é boa que so e eu ja vou passar a mesa.
Estou ainda na Argelia, mais precisamente numa região chamada cabilia, povoada quase totalmente por berberos que ja estavam aqui antes mesmo da chegada dos fenicios.
Tenho convivido com muitas mulheres, e ainda que vinte dias é pouco tempo demais para falar com segurança do que quer que seja, acho que ja consegui perceber algumas coisas.
Na lingua cabila, por exemplo, as formulas de saudaçao enderaçadas a mulher e ao homem sao completamente diferentes: Uma mulher so existe pela familia, pelo marido e pelos filhos, um homem existe por ele mesmo.Por isso quando se encontra uma mulher se diz, literalmente, que deus abençoe os teus, e ao contrario, quando se encontra com um homem, a saudaçao correta é, que deus te abençoe.
A partir dai se começa a compreender um pouquinho a relaçao entre homens e mulheres, mas isso sera para depois porque a gororoba por aqui é boa que so e eu ja vou passar a mesa.
Mercedes Sosa
Na segunda feira, dia 4 morreu umas das mais belas vozes da America Latina, e eu la, num povoado perdido da Cabilia Argelina estava completamente impedida de entrar no blog, porque, so Allah sabe.
Mercedes Sosa abriu minha mente para a musica de protesto latino americana, depois dela conheci Silvio, Pablo, Leon e todos os outros que por meio de uma poesia musical muito proximo do perfeito me ajudaram a ser quem sou, Obrigada Negra, você cumpriu como poucos a tua função neste mundo e melhorou consideravelmente a existência de todos que amamos a musica de nosso continente.
Mercedes Sosa abriu minha mente para a musica de protesto latino americana, depois dela conheci Silvio, Pablo, Leon e todos os outros que por meio de uma poesia musical muito proximo do perfeito me ajudaram a ser quem sou, Obrigada Negra, você cumpriu como poucos a tua função neste mundo e melhorou consideravelmente a existência de todos que amamos a musica de nosso continente.
quarta-feira, 16 de setembro de 2009
Salvador Allende
ALLENDE
Para matar al hombre de la paz
para golpear su frente limpia de pesadillas
tuvieron que convertirse en pesadilla,
para vencer al hombre de la paz
tuvieron que congregar todos los odios
y además los aviones y los tanques,
para batir al hombre de la paz
tuvieron que bombardearlo hacerlo llama,
porque el hombre de la paz era una fortaleza
Para matar al hombre de la paz
tuvieron que desatar la guerra turbia,
para vencer al hombre de la paz
y acallar su voz modesta y taladrante
tuvieron que empujar el terror hasta el abismo
y matar mas para seguir matando,
para batir al hombre de la paz
tuvieron que asesinarlo muchas veces
porque el hombre de la paz era una fortaleza,
Para matar al hombre de la paz
tuvieron que imaginar que era una tropa,
una armada, una hueste, una brigada,
tuvieron que creer que era otro ejercito,
pero el hombre de la paz era tan solo un pueblo
y tenia en sus manos un fusil y un mandato
y eran necesarios mas tanques mas rencores
mas bombas mas aviones mas oprobios
porque el hombre de la paz era una fortaleza
Para matar al hombre de la paz
para golpear su frente limpia de pesadillas
tuvieron que convertirse en pesadilla,
para vencer al hombre de la paz
tuvieron que afiliarse siempre a la muerte
matar y matar mas para seguir matando
y condenarse a la blindada soledad,
para matar al hombre que era un pueblo
tuvieron que quedarse sin el pueblo.
Mario Benedetti
Para matar al hombre de la paz
para golpear su frente limpia de pesadillas
tuvieron que convertirse en pesadilla,
para vencer al hombre de la paz
tuvieron que congregar todos los odios
y además los aviones y los tanques,
para batir al hombre de la paz
tuvieron que bombardearlo hacerlo llama,
porque el hombre de la paz era una fortaleza
Para matar al hombre de la paz
tuvieron que desatar la guerra turbia,
para vencer al hombre de la paz
y acallar su voz modesta y taladrante
tuvieron que empujar el terror hasta el abismo
y matar mas para seguir matando,
para batir al hombre de la paz
tuvieron que asesinarlo muchas veces
porque el hombre de la paz era una fortaleza,
Para matar al hombre de la paz
tuvieron que imaginar que era una tropa,
una armada, una hueste, una brigada,
tuvieron que creer que era otro ejercito,
pero el hombre de la paz era tan solo un pueblo
y tenia en sus manos un fusil y un mandato
y eran necesarios mas tanques mas rencores
mas bombas mas aviones mas oprobios
porque el hombre de la paz era una fortaleza
Para matar al hombre de la paz
para golpear su frente limpia de pesadillas
tuvieron que convertirse en pesadilla,
para vencer al hombre de la paz
tuvieron que afiliarse siempre a la muerte
matar y matar mas para seguir matando
y condenarse a la blindada soledad,
para matar al hombre que era un pueblo
tuvieron que quedarse sin el pueblo.
Mario Benedetti
terça-feira, 15 de setembro de 2009
Férias de novo
Domingo viajo para a Argélia, quem sabe voltando de la eu deixo de ser esse ser humano sem graça e sem assunto e publique alguma coisa aqui no blog. Mas tem fotinhas la no Imagens, sempre tem.
domingo, 13 de setembro de 2009
sexta-feira, 11 de setembro de 2009
Brice Hortefeux e mais uma gafe
"Il en faut toujours un. Quand il y en a un ça va. C'est quand il y en a beaucoup qu'il y a des problèmes." *
Comentario infeliz do ministro da integração, imigração e identidade nacional Brice Hortefeux, durante a faculdade de verão do UMP (partido governamental), referindo-se a um militante de origem magrebina.
* E sempre necessario um. Quando é so um tudo bem. E quando são muitos que começam os problemas.
Mas sabem o que mais me incomoda? Nem é o fato de alguém lembrar que "apesar de arabe ele come porco", nem do ministro dizer que quando eles sao muitos causam problemas ou que ele não se parece com o prototipo. O incômodo para mim, o que me causa realmente mal estar é o corozinho colonialista, preconceituoso, e cheio de piedade que la de tras começa; " é o nosso, é o nosso arabezinho". Terrivel isso não?
So para lembrar esse é o mesmo ministro que organizou a reunião sobre a imigração em Vichy.
quarta-feira, 2 de setembro de 2009
Fico meio reticente em publicar videos ou links em inglês. Acho que é um pouco esnobe isso de achar que todo mundo vai entender uma lingua que não é a nossa. Me irrita consideravelmente também ver posts de brasileiros carregados de inglês como se fosse chic, moderno, atual, colocar tudo em inglês. De uma pobreza...
Pois é, as quatro linhas acima são para tranquilizar a minha consciência porque eu queria colocar esse video abaixo que achei tão bonito.
Pois é, as quatro linhas acima são para tranquilizar a minha consciência porque eu queria colocar esse video abaixo que achei tão bonito.
terça-feira, 1 de setembro de 2009
A propaganda da Triton
O texto do post e as fotos da publicidade da Triton foram retirados do blog, http://sindromedeestocolmo.com/ da Denise Arcoverde.
Obrigada Denise por me permitir a reprodução do post.
Obrigada Denise por me permitir a reprodução do post.
Apesar de acontecer a toda hora, em todo o país, somente de vez em quando, um caso de mulher morta pelo marido ou namorado e vira assunto. Aí é matéria na Globo e a sociedade se emociona e se revolta, depois esquece.
Quanto mais machista e falocrático, o país, maior a banalização da violência contra mulher. O Brasil tem avançado em tantas coisas, mas minha impressão, aqui de fora, é que a situação da mulher não muda nada ou até piora.
Essas fotos acima são da nova campanha de primavera-verão da marca Triton. Elas seriam impensáveis em muitos países que já passaram por um processo de discussão sobre o impacto da mídia na sociedade. Agora me digam, porque cargas d’água a gente tem de aceitar que uma empresa ganhe dinheiro às custas da glamurização da violência e assassinato de mulheres?
Quando eu falo tanto, aqui no blog, sobre essas campanhas publicitárias, não é somente porque as imagens de mulheres sendo agredidas fisicamente “não me agradam”. Não é porque eu “não consigo separar a ficção da realidade” ou porque eu quero censurar a “enorme criatividade” dos nossos premiados publicitários.
O fato é que ninguém sai impune desse bombardeio de imagens degradantes, da mulher sempre vista como parte mais fraca, vítima, submissa ao garanhão, dono do poder de vida e morte. Há poucos dias, a socióloga Luzia Azevedo, da Universidade Federal de Pernambuco (UFPE) defendeu que a maioria dos crimes contra a mulher estão relacionados ao sexismo, mesmo quando não são registrados dessa forma.
E não me digam que é “somente uma propaganda”, não. No estudo Images of women in advertisements: Effects on attitudes related to sexual aggression, de Katherine Covell e Kyra Lanis, por exemplo, demonstraram que homens expostos a propagandas nas quais as mulheres eram usadas como objeto sexual, posteriormente, eram mais tolerantes e apoiavam atitudes relacionadas à violência sexual. Enquanto que mulheres expostas a imagens de mulheres em uma postura mais forte se mostraram menos tolerantes a essas situações.
Eu não sou cliente da Triton, mas se fosse, deixaria de compra lá, agora. Basta, né?
Vamos escrever para o CONAR, que é o conselho “auto-regulamentador” da publicidade denunciando o abuso dessas fotos acima? No site do Conar, tem um link (logo abaixo do banner) para reclamações. Quanto mais pessoas escreverem, mais fácil de sermos ouvidas. Por favor, divulguem esse absurdo em seus blogs, Facebook, Orkut e listas de discussão,
Vamos escrever para o CONAR, que é o conselho “auto-regulamentador” da publicidade denunciando o abuso dessas fotos acima? No site do Conar, tem um link (logo abaixo do banner) para reclamações. Quanto mais pessoas escreverem, mais fácil de sermos ouvidas. Por favor, divulguem esse absurdo em seus blogs, Facebook, Orkut e listas de discussão,
Também podemos demonstrar nossa indignação direto à Triton. Não achei email no site deles, mas tem um Blog onde podemos deixar algum comentário. E, quem tem conta no Twitter, pode postar sobre isso, colocando o id deles: @tritonlovers.
Não dá pra fazer de conta que isso aí “não tem nada demais”, né ?!
Não dá pra fazer de conta que isso aí “não tem nada demais”, né ?!
Para quem quiser ler o post no blog da Denise:
sexta-feira, 28 de agosto de 2009
BORGES NO INFERNO
José Eduardo Agualusa
Jorge Luis Borges soube que tinha morrido quando, tendo fechado os olhos para melhor escutar o longínquo rumor da noite crescendo sobre Genebra, começou a ver. Distinguiu primeiro uma luz vermelha, muito intensa, e compreendeu que era o fulgor do sol filtrado pelas suas pálpebras. Abriu os olhos, inclinou o rosto, e viu uma fileira de densas sombras verdes. Estava estendido de costas numa plantação de bananeiras. Aquilo deixou-o de mau humor. Bananeiras?! Ele sempre imaginara o paraíso como uma enorme biblioteca: uma sucessão interminável de corredores, escadas e outros corredores, ainda mais escadas e novos corredores, e todos eles com livros empilhados até o tecto.
Levantou-se. Endireitou-se com dificuldade, sentindo-se desconfortável dentro do próprio corpo subitamente rejuvenescido (quando morremos reencarnamos jovens e Borges não se recordava de como isso era.) Caminhou devagar entre as bananeiras. Parecia-lhe pouco provável encontrar ali alguém conhecido, ou seja, alguém de quem tivesse lido algo. Ou alguém sobre quem tivesse lido algo. Nesse caso seria alguém um pouco menos conhecido, ou um pouco menos alguém, ou ambas as coisas.
A plantação prolongava-se por toda a eternidade. Uma dúvida começou a atormentá-lo: talvez estivesse, afinal, não no paraíso, mas no inferno. Para onde quer que olhasse só avistava as largas folhas verdes, os pesados cachos amarelos, e sobre essa idêntica paisagem um céu imensamente azul. Borges lamentava a ausência de livros. Se ali ao menos existissem tigres – tigres metafóricos, claro, com um alfabeto secreto gravado nas manchas do dorso –, se houvesse algures um labirinto, ou uma esquina cor-de-rosa (bastava-lhe a esquina), mas não: só avistava bananeiras, bananeiras, ainda bananeiras. Bananeiras a perder de vista.
Percorreu sem cansaço, mas com crescente fastio, a infinita plantação. Era como se andasse em círculos. Era como se não andasse. Fazia-lhe falta a cegueira. Cego, o que não via tinha mais cores do que aquilo – além do mistério, claro. Como é que um homem morre na Suíça e ressuscita para a vida eterna entre bananeiras?
Borges não gostava da América Latina. A Argentina, como se sabe, é um país europeu (ou quase), que por desgraça faz fronteira com o Brasil, Chile, Uruguai e Paraguai. Para Borges, aquele quase sempre foi um espinho cravado no fundo da alma. Isso e a vizinhança. Os índios ele ainda tolerava. Tinham fornecido bons motivos para a literatura e além disso estavam mortos. O pior eram os negros e os mestiços, gente capaz de transformar o grande drama da vida – da vida, meu Deus! – numa festa ruidosa. Borges sentia-se europeu. Gostava de ler os clássicos gregos (gostaria de os ter lido em grego). Gostava do silêncio poderoso das velhas catedrais.
Foi então que a viu. À sua frente uma mulher flutuava, pálida e nua, sobre as bananeiras. A mulher dormia, com o rosto voltado para o sol e as mãos pousadas sobre os seios, e era belíssima, mas isso para Borges não tinha grande importância (a especialidade dele sempre foram os tigres). Horrorizado compreendeu o equívoco. Deus confundira-o com outro escritor latino-americano. Aquele paraíso fora construído, só podia ter sido construído, a pensar em Gabriel García Marquez.
Jorge Luis Borges sentou-se sobre a terra úmida. Levantou o braço, colheu uma banana, descascou-a e comeu-a. Pensou em Gabriel García Marquez e voltou a experimentar o intolerável tormento da inveja. Um dia o escritor colombiano fechará os olhos, para melhor escutar o rumor longínquo da noite, e quando os reabrir estará deitado de costas sobre o lajedo frio de uma biblioteca. Caminhará pelos corredores, subirá escadas, atravessará outros corredores, ainda mais escadas e novos corredores, e em todos eles encontrará livros, milhares, milhões de livros. Um labirinto infinito, forrado de estantes até o tecto, e nessas estantes todos os livros escritos e por escrever, todas as combinações possíveis de palavras em todas as línguas dos homens.
Jorge Luis Borges descascou outra banana e nesse momento um sorriso – ou algo como um sorriso – iluminou-lhe o rosto. Começava a adivinhar naquele equívoco cruel um inesperado sentido: sendo certo que o paraíso do outro era agora o inferno dele, então o paraíso dele haveria de ser, certamente, o inferno do outro.
Borges terminou de descascar a banana e comeu-a. Era boa. Era um bom inferno, aquele.
do blog Caquis Caidos de Adriana Lisboa
José Eduardo Agualusa
Jorge Luis Borges soube que tinha morrido quando, tendo fechado os olhos para melhor escutar o longínquo rumor da noite crescendo sobre Genebra, começou a ver. Distinguiu primeiro uma luz vermelha, muito intensa, e compreendeu que era o fulgor do sol filtrado pelas suas pálpebras. Abriu os olhos, inclinou o rosto, e viu uma fileira de densas sombras verdes. Estava estendido de costas numa plantação de bananeiras. Aquilo deixou-o de mau humor. Bananeiras?! Ele sempre imaginara o paraíso como uma enorme biblioteca: uma sucessão interminável de corredores, escadas e outros corredores, ainda mais escadas e novos corredores, e todos eles com livros empilhados até o tecto.
Levantou-se. Endireitou-se com dificuldade, sentindo-se desconfortável dentro do próprio corpo subitamente rejuvenescido (quando morremos reencarnamos jovens e Borges não se recordava de como isso era.) Caminhou devagar entre as bananeiras. Parecia-lhe pouco provável encontrar ali alguém conhecido, ou seja, alguém de quem tivesse lido algo. Ou alguém sobre quem tivesse lido algo. Nesse caso seria alguém um pouco menos conhecido, ou um pouco menos alguém, ou ambas as coisas.
A plantação prolongava-se por toda a eternidade. Uma dúvida começou a atormentá-lo: talvez estivesse, afinal, não no paraíso, mas no inferno. Para onde quer que olhasse só avistava as largas folhas verdes, os pesados cachos amarelos, e sobre essa idêntica paisagem um céu imensamente azul. Borges lamentava a ausência de livros. Se ali ao menos existissem tigres – tigres metafóricos, claro, com um alfabeto secreto gravado nas manchas do dorso –, se houvesse algures um labirinto, ou uma esquina cor-de-rosa (bastava-lhe a esquina), mas não: só avistava bananeiras, bananeiras, ainda bananeiras. Bananeiras a perder de vista.
Percorreu sem cansaço, mas com crescente fastio, a infinita plantação. Era como se andasse em círculos. Era como se não andasse. Fazia-lhe falta a cegueira. Cego, o que não via tinha mais cores do que aquilo – além do mistério, claro. Como é que um homem morre na Suíça e ressuscita para a vida eterna entre bananeiras?
Borges não gostava da América Latina. A Argentina, como se sabe, é um país europeu (ou quase), que por desgraça faz fronteira com o Brasil, Chile, Uruguai e Paraguai. Para Borges, aquele quase sempre foi um espinho cravado no fundo da alma. Isso e a vizinhança. Os índios ele ainda tolerava. Tinham fornecido bons motivos para a literatura e além disso estavam mortos. O pior eram os negros e os mestiços, gente capaz de transformar o grande drama da vida – da vida, meu Deus! – numa festa ruidosa. Borges sentia-se europeu. Gostava de ler os clássicos gregos (gostaria de os ter lido em grego). Gostava do silêncio poderoso das velhas catedrais.
Foi então que a viu. À sua frente uma mulher flutuava, pálida e nua, sobre as bananeiras. A mulher dormia, com o rosto voltado para o sol e as mãos pousadas sobre os seios, e era belíssima, mas isso para Borges não tinha grande importância (a especialidade dele sempre foram os tigres). Horrorizado compreendeu o equívoco. Deus confundira-o com outro escritor latino-americano. Aquele paraíso fora construído, só podia ter sido construído, a pensar em Gabriel García Marquez.
Jorge Luis Borges sentou-se sobre a terra úmida. Levantou o braço, colheu uma banana, descascou-a e comeu-a. Pensou em Gabriel García Marquez e voltou a experimentar o intolerável tormento da inveja. Um dia o escritor colombiano fechará os olhos, para melhor escutar o rumor longínquo da noite, e quando os reabrir estará deitado de costas sobre o lajedo frio de uma biblioteca. Caminhará pelos corredores, subirá escadas, atravessará outros corredores, ainda mais escadas e novos corredores, e em todos eles encontrará livros, milhares, milhões de livros. Um labirinto infinito, forrado de estantes até o tecto, e nessas estantes todos os livros escritos e por escrever, todas as combinações possíveis de palavras em todas as línguas dos homens.
Jorge Luis Borges descascou outra banana e nesse momento um sorriso – ou algo como um sorriso – iluminou-lhe o rosto. Começava a adivinhar naquele equívoco cruel um inesperado sentido: sendo certo que o paraíso do outro era agora o inferno dele, então o paraíso dele haveria de ser, certamente, o inferno do outro.
Borges terminou de descascar a banana e comeu-a. Era boa. Era um bom inferno, aquele.
do blog Caquis Caidos de Adriana Lisboa
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